27/09/2022 às 21h16m - Atualizado em 27/09/2022 às 22h29m
Família de comerciante morto em operação policial na Maré nega ligação com o tráfico; ele deixou Timbaúba há 30 anos para morar no Rio de Janeiro
O barraqueiro José Henrique da Silva, de 53 anos, teria sido morto quando levava mercadorias para a barraca que tem na região
Apesar de a Polícia Militar dizer que todos os sete mortos da operação desta segunda-feira na Comunidade da Vila do João, no Complexo da Maré, estavam envolvidos com o tráfico de drogas e atiraram contra os militares que participavam da ação, a família do barraqueiro José Henrique da Silva, de 53 anos, rechaça a informação e diz que ele não tinha qualquer envolvimento com o crime. De acordo com parentes, o comerciante teria sido alvejado por um tiro supostamente disparo por policiais militares quando estava indo entregar mercadorias numa barraca na Vila do João.
Entretanto, a PM salienta que o homem estava entre os criminosos que atiraram contra os agentes. A própria polícia chegou a informar que levou o homem para o Hospital Federal de Bonsucesso, mas ele não resistiu. Na manhã desta terça, parentes de José Henrique estiveram no Instituto Médico-Legal (IML) do Centro para liberar o corpo do vendedor.
Em nota, a assessoria de imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar informa que todas as circunstâncias das ações estão sendo apuradas pela Polícia Civil e que "os policiais militares envolvidos na operação já foram ouvidos e a corporação também instaurou um procedimento apuratório para averiguar a conduta dos policiais".
— Ele era trabalhador, bombeiro hidráulico e trabalhava como barraqueiro dentro da comunidade para ter uma renda a mais para a família. Ele estava voltando de casa para repor a mercadoria da barraca onde trabalha com a mãe — contou a técnica de enfermagem, de 41 anos, enteada do homem. — Ele foi abordado naquela troca de tiros. Foi isso que os moradores contam. Quando ele passou, a polícia deve ter pensado que ele era bandido e atirou. A comunidade toda conhece ele. A gente só quer que ele não seja taxado como bandido. Ele não era. Era trabalhador. A gente só quer esclarecer. Ele não merece morrer do jeito que morreu e ter a imagem dele completamente suja. Meu padrasto morava lá há mais de 30 anos. Só com a minha mãe ele tem mais de 23 anos de casado. Ele era muito alegre, feliz, gostava da vida. Ele era pela família. Um pai para mim. É muito triste para a gente. Não tenho palavras — finaliza a mulher.
Queria dar uma vida melhor para a família, diz enteada
Há quase 30 anos, quando deixou a cidade de Timbaúba, município que fica no Norte de Pernambuco, o bombeiro hidráulico José Henrique da Silva tinha como objetivo dar uma vida melhor para sua família. Na capital fluminense o homem teria trabalhado com um pouco de tudo: inclusive nas obras de reforma do Maracanã. Mas, ali teria sofrido um acidente e, há cerca de 10 anos, foi afastado pelo INSS por problema na coluna.
Para não deixar faltar nada para a família, ele passou a vender frango empanado com a esposa durante a semana e, nos fins de semana, bebidas nos bailes funk que acontecem nas comunidades da Vila do João e dos Pinheiros. De acordo com parentes do homem, às 4h desta segunda, ao notar a ação policial, ele saiu de moto e foi até a Vila do João buscar a esposa que trabalhava na venda e fechar o local. Antes de chegar, porém, ele teria sido alvejado.
Seu José deixa esposa, com quem era casado há mais de 23 anos, e três filhos, e uma enteada. Coube a enteada de Seu José reconhecer seu corpo.
Assim como os parentes do bombeiro hidráulico, familiares dos outros seis homens mortos no confronto entre policiais e bandidos do Complexo da Maré chegam no Instituto Médico-Legal (IML) do Centro para liberaram os corpos. Eles não quiseram falar.
Segundo o Hospital Federal de Bonsucesso, a unidade médica “recebeu 15 pessoas em decorrência do confronto de operação policial”.
De acordo com a direção o hospital, “sete pessoas já chegaram em óbito (todos homens), um permanece internado estável, dois foram transferidos para o Hospital estadual Getúlio Vargas e cinco pessoas foram atendidas e liberadas pela equipe médica.
A PM informou que três dos feridos foram presos por ligações com o crime organizado do Complexo da Maré. A Polícia Civil ainda não informou a identidade dos 26 presos. O caso foi registrado na 21ª DP (Bonsucesso).
Nesta terça, a Polícia Militar reforçou o patrulhamento nas vias expressas, dia seguinte a operação que fechou três das principais vias expressas da Zona Norte: a Linha Vermelha, a Linha Amarela e a Avenida Brasil. De acordo com a PM, agentes do Batalhão de Rondas Especiais e Controle de Multidão (Recom), do Batalhão de Choque e Batalhão de Policiamento em Vias Especiais (BPVE) estão nos acessos ao Complexo da Maré e no patrulhamento das avenidas.
Durante a tarde de segunda, moradores do conjunto de favelas organizaram protestos e fecharam as vias expressas.No início da tarde de segunda, a Linha Amarela foi interditada. O trânsito na via foi interrompido por volta das 14h30. A circulação de veículos no local voltou ao normal cerca de 40 minutos depois.Ao longo do dia, o Centro de Operações Rio (COR) chegou a pedir que os motoristas evitassem a Linha Amarela e a Linha Vermelha. O melhor trajeto foi a Avenida Brasil.
Durante o confronto, moradores e motoristas ficaram na linha de tiro. Segundo a polícia, o objetivo da operação era conter uma tentativa de saída de bandidos do local para invadirem outras favelas.